Ecos da diversidade: representatividade que faz história

Autora: Lisiane Macedo de Lima Rodrigues

Coautora: Maria Vitória Motta Ignácio 

Palavras-chave: Ancestralidade; pertencimento; representatividade; diversidade; pluralidade; responsabilidade.

O Colégio João XXIII propõe uma obra pedagógica humanitária, democrática e laica, embasada na liberdade de pensamento, valorizando a diversidade não só entre os estudantes, mas também entre os profissionais, sendo ela de gênero, etnia, faixa etária ou deficiência (PCD). A coletividade não é apenas a soma de indivíduos, mas a construção de um território comum onde saberes, práticas culturais e modos de vida sustentáveis convivem, se dialogam e se fortalecem. Como nosso professor de Ciências explica: “Para um ecossistema ser completo, precisa ser diverso, e assim se tornará saudável”. 

Um ecossistema completo possui uma grande variedade de espécies, interações entre os seres vivos e o ambiente físico e um conjunto de ciclos e relações. No ambiente profissional não é diferente, empresas com equipes diversas são mais criativas, inovadoras e lucrativas, visto que a pluralidade de perspectivas enriquece a resolução de problemas e a criação de soluções. Para que a empresa obtenha sucesso neste objetivo, é necessário que seja assumida a responsabilidade de combater comportamentos discriminatórios para garantir um ambiente respeitável e confiável para todos os colaboradores. Esta coletividade emerge como uma prática que articula pertencimento, ancestralidade e compartilhamento de saberes, atravessando fronteiras disciplinares e institucionais. 

Podemos citar como exemplo uma mulher negra contratada pelo Colégio para trabalhar no setor da limpeza, uma mãe solo que sempre se esforçou ao máximo para criar seus dois filhos sozinha, advinda de ancestrais que também criaram suas famílias sozinhas. Ela começou aos pés da rotina, no setor da limpeza, cuidando dos espaços que acolhem a infância. A cada pausa, nutria a curiosidade se inspirando nas trocas que tinha com colegas educadores. Sua voz ganhou força, moldando-se em sonhos que não cabiam mais no bolso. Descobriu na docência a maneira de devolver à comunidade o cuidado que recebeu. A cada página virada, entre uma tarefa e outra, sonhava em ir além, em aprender e compartilhar conhecimento. 

Embora as desigualdades econômicas e sociais tenham limitado o reconhecimento de sua trajetória anteriormente, com coragem, enfrentou desafios com a cabeça erguida e encontrou tempo para estudar, carregando na alma a fé de quem não desiste, reconhecendo a força daquelas que vieram antes dela. Decidida a estudar Pedagogia e se tornar exemplo para uma filha de 13 anos e um filho de 11 anos, hoje já auxilia a professora dentro de sala, inspirando com histórias de persistência e superação, ensinando com paixão, lembrando que cada obstáculo pode abrir portas. Guarda um saber que ilumina os dias de seus dois  filhos, que a amam muito. Ela é prova viva de que a jornada pode ter raízes profundas e asas que não se quebram. Colegas e líderes de seu ambiente profissional perceberam o seu talento e a incentivaram a ganhar confiança, fortalecendo o seu propósito. Mostraram que essa transformação seria enriquecedora não só na vida dela, mas também nas vidas das crianças que seriam atendidas por ela nas salas de aula.  

Como ela sabiamente contou com muita emoção: “Enxerguei que as crianças são como sementinhas, que precisam ser regadas de amor, afeto, cuidado, alegria e confiança. Eu entrava nas salas para limpar e me sentava no chão para brincar com elas. Ali, eu sabia que podia liberar a minha criança interior, que por sinal, lateja aqui dentro! No começo eu queria só concluir os estudos, só depois fui percebendo que queria e podia ser algo a mais. E um dia meu coração gritou e sorriu! Eu vi uma equipe inteira caracterizada com fantasias de princesas, fadas e vários personagens para dar uma aula animada para as crianças. Foi naquele momento que surgiu um sonho e que logo deixou de ser só meu, o de ser professora também. De me divertir, aprender e ensinar ao mesmo tempo. E mesmo sem reconhecer minha própria força, mesmo me impondo limites, pensando que não seria capaz, todos ao meu redor me encorajavam cada vez mais a efetivar a minha matrícula na faculdade. O nervosismo foi grande, mas fiz! E quando eu senti que deveria me arriscar mais, surgiu uma oportunidade de trabalho na área da Pedagogia, fora do João. Foi uma decisão muito difícil, mas que me fez perceber que nada acontece por acaso. Consegui voltar com a bagagem mais preenchida de aprendizados, o que me ajudou a crescer profissionalmente. Depois que retornei, ouvi de uma incrível professora que agora eu realmente estava pronta para ficar em sala de aula, ao lado delas. Queria acrescentar que tudo que aconteceu foi um incentivo de todos, e que apesar de não sonhar tão alto quando entrei no João, faz pensar que vale apena se arriscar, escutar, poder deixar alguém te fazer olhar o mundo diferente. Entrei no João com um propósito de pagar meus aluguéis atrasados, e jamais imaginaria que estaria onde estou, terminando minha faculdade e trabalhando num lugar em que as professoras me fizeram encantar e admirar. Nada foi fácil, foi com muita ajuda dos meus filhos e pessoas que acreditaram em mim até quando eu mesma já não acreditava. Ao lado de meus colegas, eu me senti um pouco sendo semente também, recebi amor, cuidado, incentivo e apoio de todos que me ajudaram a não desistir. Sinto uma gratidão imensa por essa trajetória e pelas oportunidades que me foram dadas”. 

Uma mulher, símbolo de orgulho e resistência para seus colegas, principalmente para outras mulheres negras que a admiram e enxergam nela a possibilidade de conquistas reais. Esse emponderamento amplia a diversidade de narrativas, mostrando que podemos desafiar os estereótipos e ocupar espaços onde mulheres negras sejam capazes de compartilhar suas perspectivas sem silenciamento no ambiente profissional. E o apoio institucional pode ampliar horizontes e promover inclusão real no ambiente de trabalho. 

Pertencimento não é apenas reconhecimento simbólico: quando pessoas se reconhecem como pertencentes, constroem redes de apoio mútuo, participam de decisões e viram agentes de mudança. Nesse espaço, o movimento entre o mundo externo e o cotidiano escolar cria uma rede de significados que legitimam as diferenças como fonte de riqueza. 

O compartilhamento de saberes é a prática pela qual os conhecimentos circulam de forma dialogada e horizontal, combatendo estigmas e promovendo a representatividade. A diversidade étnica nos incentiva a reconhecer a ancestralidade desenvolvendo a valorização de rituais, cosmologias, formas de organização comunitária e modos de cuidado que sustentam a vida, a solidariedade e a responsabilidade coletiva com o meio ambiente, reconhecendo como fonte de saberes que orientam práticas presentes. 

Para além disso, a aproximação entre diferentes faixas etárias fomenta a troca de conhecimentos, memória institucional e inovação. Já a diversidade de gênero fortalece o respeito mútuo e a equidade nas equipes, abrindo espaço para o melhor de cada pessoa. Ao compreender a pluralidade de identidades de gênero, reconhecemos que há muitas formas de ser e de se expressar. Valorizar essas vozes é mais que justiça social — é uma estratégia poderosa que traz novas perspectivas, talentos e oportunidades, enriquecendo o ambiente corporativo e impulsionando resultados. 

Um ambiente que valoriza e acolhe as diferenças, incluindo Pessoas com Deficiência (PCDs), gera uma cultura de empatia, justiça e um clima verdadeiramente positivo para todos os colaboradores. Empresas inclusivas não apenas atraem, mas retêm talentos qualificados que buscam organizações com valores alinhados à diversidade e à inclusão. 

Existem muitos desafios pela frente para que a sociedade se torne mais igualitária, mais equilibrada, isso envolve mudanças culturais profundas. É preciso alinhar liderança, treinamentos e processos de recrutamento para que a diversidade não seja apenas simbólica, mas sim efetiva. 

A comunicação aberta e o espaço seguro para vozes antes discriminadas servirão para a construção de um ambiente em que todos se sintam pertencentes e para o bem-estar coletivo. Que possam existir muitas mais pessoas como a nossa Auxiliar de Limpeza que hoje é Auxiliar de Ensino, como os nossos colegas da Portaria, como as nossas Supervisoras, ou o nosso Jovem Auxiliar Administrativo do Audiovisual, que todos possam se sentir pertencentes a esta Instituição e sigam compartilhando seus saberes com a comunidade, mostrando que a cada amanhecer nasce a esperança de um espaço onde vozes diferentes se ouçam sem medo, traçando histórias antes silenciadas. 

É preciso ouvir, verdadeiramente ouvir, cada relato que rompe este silêncio. Erros aparecem, o desconforto cresce, e o medo de falhar tenta nos puxar para trás. Mas a diversidade não é regra, é respiração que mantém a criatividade viva em cada projeto. Quando uma equipe encontra empatia, surge uma força que transforma metas em conquistas reais e o ambiente profissional deixa de ser apenas um espaço de trabalho e se torna uma casa onde pertencemos, sendo essa essência que faz todo o coletivo prosperar.