Maria Beatriz Luce*
À comunidade do Colégio João XXIII,
Com grande alegria escrevo-lhes esta carta ao ser convidada a participar da inauguração de um novo projeto do Colégio João XXIII, a Revista Lugarejo. Tomo como inspiração um dos preciosos legados de Paulo Freire, Patrono da Educação Brasileira, a noção de Carta Pedagógica, porque a Lugarejo está chegando para nos pôr em “dialog-ação” sobre estudos, pesquisas e práticas de uma escola que tem história e aposta na sua atualização por humanismo, ciência e arte. Penso, pois, na Lugarejo como uma promissora iniciativa do Núcleo de Formação Docente, que (re)assume uma função originária do então Instituto Educacional João XXIII, da qual participei lá em 1971, quando foi criado o Setrein.
Em boa hora! Um belo projeto de “palavração” pedagógica. Publicar em palavras e imagens, sons e movimentos, aproveitando as possibilidades das tecnologias contemporâneas, para expor nossas leituras de mundo, nossas ideias e fazeres, referências e experimentos. Assim, a Lugarejo vem se fazer como uma provocação ao diálogo dentro e além da comunidade escolar, porque (re)inventar nossas práticas educativas nas configurações de cada momento histórico é o desafio. Nesta perspectiva, retomo nesta carta o tema que escolhi enfatizar quando recentemente estive com o corpo docente para uma conversa sobre nossa formação profissional, na abertura das comemorações dos 60 anos desta que foi a escola em que começa minha história de magistério. Era o ano de 1968, ainda na sede da Avenida João Pessoa, eu tinha 19 anos e me formara professora primária no Instituto de Educação. Tempos de medo, sombrios e silenciosos, sem concursos à vista. Com a recomendação de minha supervisora do estágio final e entrevistas, ingressei na escola que era “a” novidade, liderada pela Professora Zilah Totta – reconhecida por sua trajetória em escolas estaduais e avançada formação. Dos primeiros passos e ao longo dos quatro anos seguintes, valores e vivências que ainda guardo e cuido, remexo e repenso. Escola comunitária laica: a participação de professores, pais/mães e estudantes.
“Liberdade, responsabilidade, solidariedade e trabalho”: Educação democrática!
“Mas como pensarmos, hoje, a educação democrática?” Creio que o projeto pedagógico de uma escola é a síntese própria de como sua comunidade interpreta e propõe atuar os valores coletivos, as relações sociais e com a natureza para formar as pessoas que amanhã sejam capazes de construir seu destino em (co)responsabilidade para com o mundo – um futuro desejável (justiça social) e uma terra habitável. Trabalhamos, então, na conexão entre passado e futuro, para evitar a ignorância e a insensibilidade, as catástrofes e a opressão. E já percebemos que se foi o tempo de modelos societários prognósticos ou idealizados. Em nossa época, dispomos de conhecimentos, do que foi dito e feito, como e por quê; e para tal transformação desejável teremos de nos valer de conscientização política para ampliar a base de participação, a noção de sentido coletivo, podendo daí garantir as condições de sustentabilidade social e ambiental. Retomo, portanto, o motivo desta Carta Pedagógica que é “dialog-ação” sobre a problemática de (re)inventar nossas práticas educativas nas configurações de cada tempo histórico e aceitar a “provoc-ação” da (re)vitalização do Núcleo de Formação Docente mediante a Revista Lugarejo. Que venha para a democratização da/na educação! Que nela possam ter palavra, figuras e voz quem se dispõe à reflexão, à ação, ao registro e à partilha, dentro e além da comunidade do Colégio João XXIII. Educação democrática é nosso compromisso!
* Conselho Editorial
É pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Seu primeiro emprego foi no Colégio João XIII, em 1968.
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